Angioedema Hereditário

Angioedema Hereditário

O Angioedema Hereditário é uma doença rara de origem genética e que é muito comumente não diagnosticada, mas que tem potencial para ser fatal.

Apesar de ter sido descrita no final dos anos 1800, ainda hoje esta é uma condição pouco conhecida até mesmo na comunidade de profissionais da saúde, por isso seu diagnóstico nem sempre é feito de maneira correta.

 

Do que se trata o Angioedema Hereditário?

O termo Angioedema hereditário é utilizado para descrever o angioedema (edema localizado, assimétrico, desfigurado e localizado na derme profunda) recorrente causado por excesso de bradicinina com forma de herança genética autossômica dominante.

Diretrizes para diagnostico e tratamento AEH 2017-Giavina-Bianchi P et al.

Os pacientes com angioedema hereditário apresentam um defeito quantitativo ou qualitativo do inibidor de C1 (C1-INH).

Sendo um pouco mais técnico, para a melhor compreensão das causas dessa doença precisamos explicar como a falha na inibição de uma enzima causa todo esse transtorno. A enzima C1 estearase faz parte de um subsistema do sistema imune chamado complemento e por meio de uma intrincada rede de interações entre dezenas de moléculas acaba, por fim, causando a produção de uma outra substância chamada Bradicinina. Como o defeito genético está em uma molécula que tem a função de inibir C1, a falta de sua inibição ocasiona uma produção exagerada de Bradicinina.

A Bradicinina tem uma função no sistema circulatório que está associada ao aumento da permeabilidade dos vasos para que seja possível que, havendo a sinalização, células de defesa consigam escapar dos vasos capilares para terem ação em uma região com um machucado, por exemplo. Por outro lado, o aumento no diâmetro dos poros dos capilares (aumento da permeabilidade) permite que, além de células de defesa, líquido escape para os tecidos e com isso há a geração do inchaço, ou edema.

Assim, frente a algum estímulo que normalmente não causaria qualquer reação deste tipo em uma pessoa sem a mutação, o paciente com Angioedema Hereditário apresenta reações parecidas com reações alérgicas com inchaços pelo corpo afetando principalmente o rosto e as extremidades e que não estão associados a coceira. Apesar de essa característica visível ser a mais facilmente detectada, pode haver o comprometimento de vários outros órgãos e sistemas, entre eles os sistemas gastrointestinal e respiratório.

O envolvimento do sistema gastrointestinal causa edema no tubo digestivo com causando dificuldade na motilidade normal dos intestinos, o que leva a dor abdominal semelhante a cólicas. Já no trato respiratório, o edema pode ocasionar complicações sérias uma vez que sua obstrução impede a entrada de ar oxigenado e a saída de ar com gás carbônico, podendo causar asfixia e morte.

 

Como é feito o diagnóstico do Angioedema Hereditário?

Diagnósticos médicos são sempre construídos com base em um contexto além da sintomatologia, por isso é muito importante a participação do paciente ou seu responsável no relato preciso dos eventos e do conhecimento da existência de um histórico pessoal ou familiar que auxilie na construção do raciocínio.

Além dessa conversa entre o médico e o paciente (a chamada anamnese), atualmente podemos lançar mão de exames de sangue e genéticos que auxiliam no diagnóstico, tanto do quadro geral de Angioedema Hereditário quanto na classificação em seus três subtipos.

  1. AEH com deficiência quantitativa de C1-INH (anteriomente designado AEH C1-INH de TIPOI) Atinge 80- 85% dos pacientes. Esta é a forma clássica da doença e é caracterizada pela baixa quantidade circulante da proteína inibidora de C1.
  2. AEH com disfunção de C1-INH (anteriormente designado como AEH C1-INH Tipo II) Atinge 15% dos pacientes. Esta forma é conhecida por não apresentar baixa quantidade da proteína inibidora de C1, mas sim uma alteração na sua função (proteína anômala).
  3. AEH com C1-INH normal (anteriromente designado como AEH C1-INH tipoIII) é o tipo identificado mais recentemente, afeta mais mulheres, e é caracterizado por sintomas semelhantes ao AEH com deficiência de C1-INH, história familiar positiva e ausência de déficit  de C1-INH.

 

O que causa a crise no Angioedema Hereditário?

Segundo informações da Associação Americana de Angioedema Hereditário as principais causas das crises nestes pacientes estão relacionadas à:

  1. Estados de humor
    1. Ansiedade
    2. Estresse
  2. Esforço físico (causando principalmente edema de extremidades)
    1. Digitação
    2. Escrita a mão por tempo prolongado
    3. Uso de máquinas cortadoras de grama
    4. Uso de ferramentas como martelos, pás e rastelos
  3. Hormônios
    1. Alterações hormonais do ciclo menstrual
    2. Gravidez
    3. Amamentação
    4. Uso de anticoncepcionais
    5. Terapia de reposição hormonal
  4. Traumas físicos
    1. Machucados e pequenas lesões
    2. Cirurgias médicas
    3. Procedimentos odontológicos

Como podemos observar, apesar de o aspecto visual do paciente durante uma crise de Angioedema se assemelhar a alguém com uma resposta alérgica sistêmica, os gatilhos e os mecanismos são bastante diferentes daqueles das alergias, por isso o tratamento também necessita ser. Sendo assim, os pacientes sofrem episódios recorrentes de edema envolvendo a pele e a submucosa de vários órgãos, e não está associado a urticária e prurido.

 

Como tratar o Angioedema Hereditário?

Como mencionado, os mecanismos imunológicos e fisiológicos envolvidos no estabelecimento do Angioedema Hereditário são diferentes daqueles das crises alérgicas, assim, é fundamental que os profissionais de saúde envolvidos no atendimento de um paciente em crise sejam informados desta condição e para isso o diagnóstico anterior é primordial.

O tratamento envolve educação e orientação  aos pacientes e familiares, com medidas preventivas e planos de ação frente as crises. Orientação quanto a eliminação de fatores desencadeantes como estresse e trauma, esportes de alto impacto e  até mesmo medicamentos que possam induzir ou prolongar uma crise.

O Tratamento medicamentoso tem três pilares: profilaxia em longo prazo, profilaxia em curto prazo e tratamento das crises.

Pensando no tratamento profilático, uma vez estabelecido o tipo de Angioedema Hereditário que o paciente apresenta, o tratamento deve ser pensado de forma a trazer funcionamento do sistema complemento de volta à normalidade pela regulação da produção e função da Bradicinina por meio de:

  1. Normalização dos níveis da proteína inibidora de C1
  2. Inibição direta de C1
  3. Controle da produção de Bradicinina por ajuste de seus precursores
  4. Modulação dos receptores sensíveis à Bradicinina

 

O  objetivo da profilaxia a longo prazo é reduzir a frequência e a gravidade das crises, e o tratamento deve ser individualizado levando em consideração a freqüência  das crises, gravidade, impacto das crises sobre a qualidade de vida do paciente e disponibilidade de tratamento para as crises de AEH. Já a profilaxia a curto prazo é indicada a pacientes submetidos a procedimentos médicos ou cirúrgicos  que envolvam risco.

Nas Crises o objetivo é inibir a síntese de bradicinina e sua ação sobre as células endoteliais. Existem três medicamentos para tratar essa situação: concentrado de inibidor de C1 derivado do plasma,  Icatibanto, Ecallantide.